quinta-feira

Autoestima e inclusão


Liderança ética 7 – Autoestima e inclusão


Autoestima e inclusão
Dois temas aparentemente muito distantes, autoestima e inclusão costumam estar nas discussões de profissionais de RH e da psicologia social e das ciências sociais. Mas geralmente não estão associados.
O mais delicado, me parece, é tratar da autoestima, por haver um “senso comum” que tem banalizado esse problema. “Especialistas” em motivação e em liderança acendem incensos para a importância de se ter ou estimular uma autoestima elevada, aliás, isso seria uma característica dos “líderes”.
O primeiro problema surge da incapacidade de se pensar uma diferença entre autoestima, autoimagem e autoconceito. Este seria o que a pessoa pensa sobre si mesma, a autoimagem seria como a pessoa considera a sua imagem, percebida tanto por si quanto pelo outro. Por fim, a autoestima seria o valor que a pessoa dá a si mesma, geralmente isso é uma combinação dos outros dois fenômenos.
Quando se fala de autoestima se fala de uma representação pessoal (auto) à qual é atribuído um valor (estima), ou seja, é o valor que uma pessoa se dá. Se concordarmos com essa definição por que deveríamos concordar com a importância de se ter uma “autoestima elevada”, conforme é dito pelos “gurus”?
O mais saudável, tanto do ponto de vista pessoal quanto social, é que uma pessoa seja capaz de se dar o valor mais aproximado do que realmente tem. Seja uma autoestima subvalorizada, seja uma supervalorizada, são dois casos de inadequação.
Para tratar especificamente da inflação da autoestima, podemos propor que o excesso de valor que a pessoa se atribui é, objetivamente, um caso de vaidade. Observem-se as pessoas de “autoestima elevada”, não são elas vaidosas (e consequentemente pedantes e exibidas)? Julgam-se um facho de luz, mas, no máximo, são rodeadas por mariposas tontas.
O termo vaidade vem do latim vanitatis e significa “vaziez”, quer dizer, característica de algo vazio. Vem de vanitas, cujo sentido se expande por “vacuidade, inutilidade, falsidade”. Ou seja, a vaidade não reflete apenas algo vazio, mas, também, inútil e falso. A pessoa vaidosa é falsa e inútil. Se o “líder” deve ser assim é porque quem se julga líder tende a ser, na verdade, um poço de vaidade. Se os RHs e gurus alardeiam que a motivação passa por promover uma autoestima elevada, na verdade estão enganando a todos e cultuando o vazio como imagem ideal. Como reza o ditado: “por fora, bela viola; por dentro, pão bolorento”. O motivo para eu inflacionar o valor que eu me dou é a necessidade de ocultar o (pouco) valor que eu acho que vou receber se o outro me conhecer de verdade, particularmente oculto meus defeitos.
Pois bem. Aqui entra o problema da inclusão. Atualmente, a maioria das discussões a respeito da inclusão no ambiente de trabalho está associada à contratação de indivíduos com deficiência. O principal problema disso é que ocorre um mascaramento de que a inclusão é, essencialmente, a competência do convívio entre as diferenças. Dirigindo a ideia de inclusão para as deficiências de aparente grande anormalidade, passa-se a impressão de que os que não têm essa grande anormalidade são normais ou superiores. Na verdade, a competência de se lidar com a diversidade é, ao mesmo tempo, a competência de se lidar com os próprios defeitos, isto é, a competência de não precisar da vaidade. O que é muito difícil.
Em uma cultura que reafirma reiteradamente a necessidade de se “vender a própria imagem” e de “ter uma aparência que inspire segurança”, cada vez menos são as virtudes e as competências que são estimadas. Se uma pessoa tem uma imagem que denuncia uma anormalidade, merece ser incluída, por comiseração. Em contrapartida, se houver a consciência de que somos todos imperfeitos, as competências serão valorizadas e as diferenças serão, pelo menos, respeitadas.
Até o que se fala sobre “motivação” poderá ser revisto, pois será motivadora a oportunidade de se conhecerem as diferenças do outro e, mesmo, a segurança de que as próprias limitações serão respeitadas, o que permite correr o risco de errar. Isso tende a levar a mais inovações, melhores relacionamentos (“clima”), colaboração e confiança.
A exclusão não é mais do que a dificuldade de se lidar com as diferenças e com as falhas, o que se pode definir como estigmas. Ou seja, quem exclui não suporta lidar com o que não é perfeito. E essa ideia de perfeição vem da própria inflação de valores, dessa “elevada autoestima”. De fato, é a vaidade que nos faz exigir nos outros, se não ser uma imagem espelhada, preferencialmente ser a imagem ideal espelhada. A vaziez desse espelho já deve ter ficado clara ao longo deste texto.
Mas o que faria com que eu buscasse identificar estigmas nos outros? Certamente isso se dá pelos preconceitos que eu teria. É impossível que uma pessoa socializada não traga preconceitos dentro de si. Portanto, o processo de inclusão não busca formar pessoas sem preconceitos, mas conscientizar as pessoas dos preconceitos que trazem para que possam conviver com as diferenças. É muito bom a gente se livrar de preconceitos, mas também é muito bom a gene sentir que é capaz de ter preconceitos (que são um tipo de defeito) e ser maior que eles. Essa autocrítica nos diminui a vaidade ao mesmo tem que nos conscientiza dela.
Aqui se pode incluir o problema da baixa autoestima. Ela pode ser solucionada por ambientes que oferecem a possibilidade de que se tenham defeitos e limitações, uma vez que a participação dos colegas, capazes de reconhecer seus defeitos e limitações, promove a inclusão e colabora com a reorganização do autoconceito e da autoimagem.
O exercício da liderança ética requer essa autocrítica e essa competência de se lidar com a simultaneidade das diferenças e dos defeitos, tanto quanto ser capaz de suportar as virtudes que os outros têm e que faltam em nós sem invejá-las, posto que a inveja é a compulsão do vaidoso. O exercício da liderança ética é, necessariamente, o exercício da inclusão.
Bernardo Monteiro de Castro
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